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Livro: Eu posso estar errado

Eu posso estar errado - Björn Natthiko | Camile Carvalho - Vida Minimalista

Eu sou do tipo de leitora que ama escolher títulos leves e inspiradores pro meu Kindle. A sensação de me deitar na rede, sentindo o vento fresco em meu rosto enquanto leio inspirações me conduz a uma atmosfera de paz e serenidade da qual desejo permanecer por muito tempo após a leitura. Mas esse livro, escrito por Björn, ou Natthiko (seu nome budista), me tirou do lugar-comum desse tipo de literatura.

Björn Natthiko Lindeblad

Bjorn nasceu na Suécia, formou-se em economia e recém-formado conseguiu trabalhar com o que achava que gostava. Como ele mesmo dizia,  “trabalhava aumentando o lucro alheio”, e era bom nisso. Apesar do estresse, da ansiedade que vivia, não tinha outros planos pra sua vida, até que percebeu que precisava fazer algo pela sua saúde mental, ou não aguentaria muito a pressão em que vivia.

Experimentou, por diversas vezes, a meditação, mas sem sucesso algum. Chegou a se inscrever em retiros na floresta, mas acabou desistindo por não ter os resultados que esperava. Segundo ele, não conseguiu silenciar as vozes interiores, não conseguiu não pensar em nada – muito pelo contrário – e sequer atingiu a paz mental. Isso devia ser apenas pros iluminados, como Buda, não pra um rapaz como ele, cheio de desejos, ansiedades e trabalho a ser feito pipocando em sua mente.

Como é possível ter uma vida digna e livre se você acredita em todos os seus pensamentos?

Mas algo o fazia não desistir, até que em um determinado momento em sua vida, conseguiu compreender melhor a meditação e os princípios budistas. Após um longo caminho, entre retiros e cursos de meditação, decidiu morar na Tailândia, onde monges da Tradição da Floresta (Budismo Theravada) tinham um monastério. E naquele momento sua vida nunca mais foi a mesma, até tomar a decisão de abandonar a vida leiga e se entregar à tradição, sendo ordenado como monge budista.

Eu posso estar errado - Björn Natthiko | Camile Carvalho - Vida Minimalista
foto do site oficial: natthiko.se

Me envolvi demais com ele

O livro me emocionou por diversas vezes. Torci com ele, chorei, me emocionei e claro, anotei vários ensinamentos que ele passava, chegando até a escrever bastante sobre alguns insights que eu tive sobre a minha própria vida. Não foi um livro leve como outros no estilo que eu andei lendo, principalmente na parte final. Aliás, o livro tem 38 capítulos, mas bem curtinhos, o que me fez pensar o tempo todo que eu leria “só mais um capítulo, depois eu paro”, e assim o fiz por dois dias seguidos até chegar ao seu fim.

Eu já tinha descoberto que, quando minha tristeza, ansiedade ou solidão ficassem opressivas demais, eu poderia escolher me concentrar na respiração e permitir a consciência plena do meu corpo, sem aceitar cegamente cada um dos pensamentos que minha mente atirasse em mim.

Não se enganem, o livro começa leve e inspirador, mas tem uma reviravolta no seu terço final. Não é spoiler, mas Natthiko foi monge por 17 anos, sendo os primeiros 6 anos no monastério da floresta da Tailândia, 1 ano em reclusão total em uma cabana próxima a um vilarejo e mais 10 anos em alguns monastérios da Europa, mais próximo de seu país de origem. Ele conta as diferenças culturais, principalmente após viver sete anos na Tailândia e voltar pro Ocidente, como os monges são vistos por aqui e pelos tailandeses.

Após os 17 anos, Bjorn entrega as vestes e volta à vida leiga, mas sem abandonar o caminho budista. Apesar de muitos desafios no retorno à “vida comum”, se torna um palestrante e professor reconhecido que rodou o mundo contando sua experiência, transmitindo os ensinamentos e inspirando muitas pessoas.

Nunca me senti totalmente confortável com a expressão atenção plena. Não sinto minha mente plena quando estou vivendo o momento. Ela está mais para uma área ampla, vazia e acolhedora, com espaço de sobra para tudo e para todos. Presença consciente.

Um alerta de gatilho

O meu alerta vai para a porção final do livro. Eu fui pega de surpresa com alguns acontecimentos que ele narrou com tantos detalhes, o que me gerou muito desconforto (mas que na visão budista são vistos com outra compreensão). Eu simplesmente não conseguia parar de ler, já era madrugada, mas também eu não conseguia parar de chorar.

Ler os capítulos finais me deixou com um nó na garganta até hoje, o que me fez abrir o notebook e escrever esse texto sobre as minhas impressões do livro.

Um dia, vamos ter que nos despedir de pessoas que significam alguma coisa para nós. Nossa única certeza é que não teremos uns aos outros para sempre. Todo o resto é um talvez.

Eu queria despejar mais por aqui…

Enfim, eu gostaria de colocar mais meus sentimentos por aqui, despejar o que está em minha mente e meu coração, mas me vejo em uma linha sutil entre escrever um texto de desabafo e uma resenha de um livro. Contar tudo que eu senti ao ler os últimos capítulos seria expor pontos do livro considerados spoilers, mas como não colocar pra fora essa bomba de emoções que ele significou pra mim?

Talvez eu escreva pra mim mesma, no meu diário, talvez eu escreva em um outro momento e publique em um post separado, mas deixo pra vocês uma pequena chama para que leiam, se assim se interessarem, essa autobiografia de um monge Theravada.

Às vezes uma porta se fecha na sua vida sem que outra tenha se aberto. Alguma coisa está menos viva do que antes, um relacionamento, um emprego, uma casa, a cidade em que você mora. Isso pode acabar sem que tenha chegado a próxima etapa. De repente, você se vê cercado de incertezas. Em quê você pode se apoiar em momentos assim? Não é importante que, nessas horas, você possa contar com um senso inerente de confiança?

Fico por aqui hoje e espero que tenham gostado desse tipo de post aqui no blog Um pouco sentimental, uma resenha fora dos padrões, uma espécie de diário da minha leitura. Certamente voltarei ao livro mais vezes para que possa relembrar de alguns ensinamentos que, para uns, podem ser banais.

Talvez até mesmo para o próprio autor, mas que para mim, em diversos momentos tocaram fundo a minha alma me fazendo relembrar de lugares e situações que eu nunca vivi. Ou vivi.

Eu posso estar errado - Björn Natthiko | Camile Carvalho - Vida Minimalista
Foto: Elisabeth Lindeblad

Espero que sua vida possa ter menos de punhos cerrados e um pouco mais mãos abertas. Que você tenha um pouco menos de controle. Um pouco mais de confiança. Um pouco menos de necessidade de saber tudo de antemão. Que você aceite um pouco mais a vida como ela é.

Categorias: Papel

Entre o papel e o digital, eu escolho os dois

agenda de papel ou digital | Camile Carvalho - Vida Minimalista

Nos estudos de Comunicação, sempre relembramos as principais escolas desde a época do rádio: cada nova invenção substituirá a anterior, que desaparecerá. A TV substituirá o Rádio. O livro digital acabará com o impresso. Mas eles nunca acabaram, muito pelo contrário, eles coexistem.

Os avanços tecnológicos chegam trazendo inovações, praticidade, transformam quilos de papeis em bits, que cabem na palma das nossas mãos. Em vez de carregar meus cadernos de Bullet Journal, meus diários, cadernos do doutorado, eu posso simplesmente ter tudo no meu celular, ou no iPad, escrever com caneta digital, escanear (por meio de fotografia) páginas e páginas de textos… mas isso realmente é o melhor para os estudos? Como fica a cognição?

Hoje já temos vários estudos caminhando pra esse ponto: apreendemos, com todo o potencial, aquilo que digitamos? Que interferências o digital trouxe no processo do aprendizado? O que a fricção da caneta no papel poroso tem de diferente do movimento de digitação dos dedos em um teclado? Os estudos são muito interessantes, qualquer dia volto aqui pra falar sobre eles (esse não é o tema central do meu texto de hoje). Mas o que venho falar é sobre o equilíbrio.

Em vez de escolher um lado, a turma do papel ou a turma do digital, por que não usar os dois? Lá na época do Vida Minimalista eu levantei a bola do movimento Paperless (sem papel). Saí digitalizando tudo, concentrando minha vida no meu notebook. Na verdade, eu usava um ainda menor, um netbook (quem lembra?). Anotava as aulas no OneNote, escaneava os artigos em papel pro PDF, digitalizei meus documentos, passei tudo pro digital. Mantive em papel apenas o que fosse realmente necessário. Tudo ao meu redor ficou mais leve e eu sabia onde encontrar de tudo. Mas não posso negar que os tempos eram outros. Não tínhamos essa enxurrada de estímulos das redes sociais (isso era lá pra 2012) e de lá pra cá muita coisa mudou. Agora, a luta não é deixa o papel de lado e viver aproveitando todos os benefícios do digital, mas sim, reduzir o tempo de tela e voltar mais pro analógico, se conectar mais com a “vida real” – mas o que é real? o digital não é real? – e dar um descanso mental pra enorme carga de informações que recebemos ao ligarmos o computador, ou ao desbloquearmos o celular.

Ano passado eu tentei voltar ao máximo pro papel. Fiz um experimento de usar agenda, planner, cadernos, tudo no papel. Comprei canetas – ai meu hiperfoco em papelaria – e fiz tudo o que eu pude no papel. No fim do ano fiz um balanço e percebi que algumas coisas realmente precisavam estar no digital, enquanto outras poderiam continuar no papel.

Os cadernos são o meu descanso mental. É quando meus olhos desviam das telas e meu corpo trabalha de forma diferente, analógica. Recorto imagens impressas pra colar no meu diário. Escrevo caprichando a letra, colo um adesivo aqui, um washi-tape ali… não me preocupo com o tempo, pois aquele momento é reservado pra isso. Imprimo um artigo e uso o marca-texto, puxo seta, anoto nas margens. Mas também vem o momento em que passo minhas anotações pra um aplicativo como o Notion, UpNote e tenho tudo pesquisável na palma da minha mão.

Equilíbrio. É tudo o que busco nessa corda-bamba do digital e do analógico. Eu não preciso escolher um dos dois, eu escolho usar os dois.

E você? Tem a vida toda no digital ou prefere o analógico? Anda na corda-bamba pendendo mais pra um lado ou pro outro ou consegue equilibrar entre os dois? Me conte aqui nos comentários como é o seu cotidiano!

Categorias: Meu Diário

Não adianta, eu amo blogs

Eu amo blogs | Camile Carvalho | Vida Minimalista

Eu juro que tentei. Já até programei posts pro meu Instagram em uma época. Fiz planejamento de conteúdo, defini um nicho, passei horas diante de uma tela pensando como eu poderia fazer diferente, melhor, adaptado à nova realidade.

Mas nunca fluiu.

Pode parecer estranho, mas estou pra completar 40 anos no dia 18 de abril e isso tem me feito refletir muito sobre minha trajetória de vida, e isso inclui a internet.

Aquela frase “eu estava aqui desde quando isso tudo era mato” é clichê, mas se aplica perfeitamente em mim. Eu vi a internet nascer. O primeiro contato que eu tive com um computador foi ainda na escola e a única coisa que tínhamos pra fazer era mexer com uma tartaruguinha digitando comandos para frente (PF), esquerda (ESQ) e quantos pixels deveria caminhar. Pra fazer um quadrado, tínhamos que usar PF50, ESQ90 e repetir até que o quadrado estivesse formado.

Sou da época do MSDOS. Tela azul com letras brancas, ou tela preta com letras verdes. Era só isso, e a empolgação de que um novo mundo estava diante de meus olhos era muito real.

Vi tudo isso se transformar até que chegou a possibilidade de termos o nosso próprio terreno na internet. Alguns sites ofereciam essa possibilidade, como o kit.net, onde eu tive o meu primeiro site. Usei MySpace, Weblogger entre outros e sempre gostei de compartilhar fotos, pensamentos, ideias sobre tudo. Até que enfim, foi criado o modelo de blog, no qual eu não precisaria mais usar o Frontpage pra mexer nos códigos HTML (o qual fiz curso!). Me aventurei a aprender CSS e nunca mais parei de escrever, estudar sobre o assunto e interagir com essa nova possibilidade de colocar a voz no mundo.

Mas as coisas mudam e eu fiquei pra trás. Sim, é essa a sensação que eu tenho. Agarrada às palavras, ao textão, à espontaneidade, do Fotolog pro Instagram foi um pulo. É verdade que bem no início usávamos aqueles filtros toscos pra que as fotos parecessem vintage, tirávamos fotos de comida, de planta, de sapato. Era tudo muito legal e diferente do que todos já estavam acostumados a fazer. O Instagram era um espaço pra experimentações. Podíamos conhecer um pouquinho mais do cotidiano não-mostrado dos nossos amigos. Até que houve uma virada no modo de produzir conteúdo.

Aliás, o próprio termo “produzir conteúdo” já indica muita coisa. Deixamos de ser as pessoas que compartilham de forma espontânea pequenos cliques do cotidiano para sermos os produtores de conteúdo. Cada um viu na plataforma um espaço de buscar seu lugar ao sol, e isso não é algo negativo. Mas tudo foi acelerando de um modo esquisito (para mim). Tem que produzir, tem que aparecer, tem que postar, tem que usar hashtag x y z, tem que… e essa agonia acabou me desmotivando a estar ali, ao mesmo tempo em que a plataforma não entregava mais, meus amigos não viam o que eu postava e eu só consigo ver propagandas goela abaixo.

Está chato, muito chato.

A internet, aliás, foi se transformando em um ambiente hostil pra mim. Se antes eu sentia que estava escrevendo para pessoas, para uma comunidade, hoje me vejo escrevendo pro vento. A minha sorte é que eu gosto de escrever pra mim mesma, a única diferença aqui é que eu clico no botão “publicar”.

Eu decidi voltar. Pode ser que eu mude de ideia daqui a 1 ano, 1 mês ou 1 dia. Mas por enquanto estou aqui. Com o domínio no meu próprio nome, deixando visível praticamente todos os posts do meu antigo blog Vida Minimalista (que entrou no ar em 2010), e com a vontade de revisar cada um deles, aos poucos.

Qual o meu nicho? Eu não sei. Como me defino? Também não faço ideia. Eu sou essa pessoa que aprende algo, reflete e escreve sobre o assunto, mais como uma forma de registro pessoal do que com a intenção de ser uma produtora de conteúdo para os outros. Eu escrevo pra mim, e gostaria de continuar sendo assim. Acho que toda minha agonia com a internet veio no momento em que comecei a pensar que deveria produzir conteúdo pros outros.

O que as pessoas querem ver aqui? Qual o tom da minha fala? Como fotografar de um jeito que agrade? Como agradar aos outros? Como me encaixar em um lugar que não me pertence? Foi isso. Foi esse o ponto onde tudo desandou. Mas basta.

Hoje eu quero escrever pra mim. Pois escrevendo pra mim eu atrairei pessoas que se alinham a quem eu sou. O texto é longo e você leu até aqui? Então você é como eu. Eu não quero me adaptar, nem tampouco quero que se adaptem a mim. Quero que seja espontâneo, leve e divertido para todos nós. Somente assim serei capaz de manter a constância fazendo algo que eu realmente amo fazer: escrever, registrar, inspirar e me conectar com pessoas reais, sem a interferência dos algoritmos.